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É quarta a noite

Quem chegar numa quarta à noite verá muitas coisas.

Se fosse para listar todos os objetos desse momento-ação, perderia muito tempo e a nada chegaria. Algumas coisas já estavam ali antes das 16 horas que transformaram-se com o passar das horas, outras foram sendo inseridas para construir os corredores que agora eu percorro. As pessoas andam não por muito tempo ou sentam em algum canto ou param numa fila como eu. 

Espero ser atendida pela moça que anota os pedidos do alto do caminhão pintado com uma cena de pôr do sol praiano com loiras e morenas de bíquini segurando suas pranchas de surf. Da linearidade organizada da fila, vamos para a aglomeração organizada depois de usar o dinheiro. Durante a espera de ter seu pedido chamado, só pensamos em  dar aquela mordida deliciosa. Se sua senha começa com “A” seu pedido é uma combinação especial, se começa com “5” é o tradicional: frango, carne ou queijo. Chamaram o 536, troquei o pedaço de papel com os números pelo meu lanche.

Estrategicamente, ao lado serviam caldo de cana. O cliente pode optar pela opção no copo ou na garrafa. As canas moídas estavam em uma lixeira verde alta que já não dava mais conta da sede daquela gente. 

Bom, se o seu gosto pede por outra bebida, a kombi lá do outro lado apresenta outra opção. No lugar dos assentos, têm barris de chopp. Não sei dizer quantos já tinham ido, mas a clientela parecia satisfeita. Sem mais cadeiras ou bancos para sentar em volta da quantidade razoável de mesas, as pessoas usavam os canteiros como banco-mesa. A segunda possibilidade é mais interessante, a conversa é feita de pertinho somente o espaço para o tira-gosto que os separam.

Algumas estruturas parecem copiar esse comportamento, ficam bem juntinhas, é até difícil saber onde termina e começa a outra se não fosse o conteúdo das bancas. Veja ali tem biscoito, bolo e mel; seguido de salsa, cebolinha, alface; depois azaléia, kalanchoe e beijo-americano.

Com a ajuda dos produtos, criam-se zonas facilmente reconhecíveis através da temperatura e dos sons. No centro é quente, fumaça sai da carne que chia quando encontra a chapa e a espátula vira o que você pedir: espetinho ou hamburger. Naquela carrocinha estão fritando churros. As bordas são frescas e diluidoras, sentei por ali para comer. Estava nos “fundos” denunciados pelos caixotes vazios, pelas sacolas esperando a próxima compra, as cadeiras que os vendedores sentam quando podem e pelas suas maneiras de transporte, quando a própria estrutura da venda não é móvel.

Penduradas nos cabos, as linguiças me lembram as ervas de passarinho agarradas nas árvores que estão por todo o lado. Caem dos galhos e se prendem aos postes de iluminação fraca. É noite nublada, mas parece emanar uma luz âmbar das paredes de tijolinho grafitados. 

O que vejo aqui, parte já estava quando todos chegaram, transformaram-se, foram consumidos e descartados sem critério ou num saco perto à espera do próximo destino. Talvez não muito longe dali.

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